ÓRFÃOS DA PÁTRIA – Abandonados pelas autoridades brasileiras, soldados da borracha recorrem aos EUA para garantir aposentadoria digna
O batalhão de pracinhas da floresta, que foram abandonados a própria
sorte após a Segunda Guerra Mundial continua a luta para ter seus
direitos reconhecidos pela pátria que os recrutou e os abandonou a
própria sorte na floresta Amazônica.
Os soldados da borracha recorreram a
Comissão Interamericana de Direitos Humanos dos EUA, para que
intervenha junto ao governo brasileiro e faça a equiparação salarial da
categoria aos pracinhas que combateram na Itália.
Com os canais de negociação praticamente esgotados no Brasil, uma
comissão formada pelo representante do Sindicato dos Pensionistas e
Soldados da Borracha do Acre (Siacre), Luziel Carvalho, a entidade
sindical do Estado de Rondônia, a Defensoria Pública do Estado do Pará e
o soldado da borracha José Soares, de 90 anos, foram recebidos para uma
audiência pública com parlamentares norte-americanos no dia 13 de
março, na cidade de Washington.
Governo será notificado pelos EUA
“O objetivo da reunião era pedir a intervenção das autoridades dos
EUA, junto ao Estado Brasileiro, já que o projeto de lei que garante uma
pensão de sete salários mínimos aos soldados da borracha está parado no
Congresso Nacional. A matéria tramitou e foi aprovada em todas as
comissões, mas a má vontade impera e as autoridades brasileiras protelam
um direito legitimo destas pessoas que são consideradas heróis apenas
no papel”, diz Luziel.
Segundo o representante do Siacre, o Governo Federal reconheceu os
soldados da borracha, como heróis, mas não garantiu os benefícios do
Art. 53, que concede um salário digno e plano de saúde aos pracinhas
brasileiros da Segunda Guerra Mundial. O Acre concentra 70% dos soldados
da borracha. Dos 60 mil convocados pelo Governo Brasileiro, através do
Tratado de Washington, apenas 12 mil ainda estão vivos. Mais de 35 mil
morreram no período da guerra.
Segundo Luziel Carvalho, um representante do Governo Brasileiro que
esteve na audiência pública nos EUA chegou a afirmar que a pensão paga
aos soldados da borracha seria justa. Ele teria comparado os
seringueiros convocados a integrar o esforço de guerra a pedido dos EUA,
a agricultores. “Foi à forma que o governo achou para dizer que não
aceita equiparar os vencimentos dos soldados da borracha ao dos
pracinhas”, enfatiza Carvalho.
O sindicalista afirma que os seringueiros enfrentaram inimigos
desconhecidos na floresta Amazônica, enquanto a força expedicionária
brasileira tinha inimigo declarado. “Os soldados da borracha não sabiam
que tipo de inimigo enfrentaria. Além dos perigos da floresta, doenças e
o território inóspito, eles viveram um regime de escravidão nas mãos de
seringalistas. No final, ainda foram descartados pela União que nem ao
menos os levou de volta para casa”.
Após a realização da audiência pública em Washington, a síntese da
denúncia dos soldados da borracha será publicada em 15 dias. O Governo
Brasileiro vai ser notificado pela Comissão Interamericana de Direitos
Humanos dos EUA, para apresentar as justificativas para a não efetivação
dos direitos reivindicados pela categoria. O governo também será
notificado formalmente para se posicionar sobre os direitos dos soldados
da borracha.
“Recorremos aos EUA porque o país investiu recursos numerosos para
custear os soldados da borracha, só que o nosso governo nunca utilizou
este dinheiro para beneficiar os homens que foram convocados por um
tratado firmado entre Brasil e EUA. Onde estão estes recursos? Por que
os convocados pelo Governo Brasileiro foram abandonados na selva
Amazônica? Estes questionamentos serão cobrados pelos parlamentares
americanos”, afirma Luziel.
As autoridades norte-americanas apoiarão a proposta de criação de um
instituto para trabalhar o acervo histórico dos soldados da borracha e
incluir a participação dos seringueiros que participaram da Segunda
Guerra Mundial, nos livros de história do Brasil. “ O
brasileiro não conhecem a história destes combatentes que sofreram,
foram abandonados e continuam sofrendo por um direito não respeitado”,
destaca Luziel Carvalho.
Pouco caso do Governo Federal
Duas reuniões teriam sido realizadas com representantes do Governo
Federal para tentar chegar a um acordo favorável aos soldados da
borracha, no ano passado. A primeira foi no Acre, com a presença do
governador Sebastião Viana (PT) e o ministro-chefe da Secretaria-Geral
da Presidência da República do Brasil, Gilberto Carvalho. A segunda
aconteceu em Brasília, nada foi resolvido e os ofícios do Siacre não
estariam sendo respondidos.
Pedidos de audiência não respondidos
Os sindicatos que representa também reclamam do descaso de
autoridades acreanas. Luziel Carvalho informou que protocolou vários
pedidos de audiência junto aos gabinetes do vice-presidente do Senado,
Jorge Viana (PT) e do primeiro-secretário da Câmara, Márcio Bittar
(PSDB), mas a assessoria dos parlamentares afirma que não tem como
encaixar a pauta dos soldados da borracha na agenda do senador e do
deputado federal do Acre.
“Percebemos a má vontade política de nossos representantes que ocupam
cargo de comando e poderiam colocar a PEC 556 na pauta de votações do
Congresso Nacional. Há mais de 10 anos, que esta proposta tramita e teve
parecer favorável de todas as comissões. Protocolamos ofícios nos
gabinetes de Jorge Viana e Márcio Bittar, mas não tivemos nenhuma
resposta. Apenas o senador Sérgio Petecão nos recebeu sem precisar
marcar audiência”, diz Luziel.
Luziel Carvalho reclama ainda que “os representantes políticos do
Acre não tem o compromisso devido com as demandas do Estado. Os
seringueiros foram considerados heróis no papel, de boa intenção o
inferno está cheio. Os soldados da borracha não precisam de
condecorações, eles precisam de dignidade no final de suas vidas. Eles
precisam é de ação firme dos políticos que só lembram-se deles e de suas
famílias em épocas de campanha eleitoral”.