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Mães de crianças especiais dão verdadeiro exemplo de força e superação

Milka e os filhos Carlos Eduardo e Mizael - Fotos: Regiclay Saady
Por Luan Cesar – “Mãe não morre nunca. Mãe ficará sempre junto de seu filho, e ele, velho embora, será pequenino feito grão de milho.” Este trecho do poema “Para Sempre”, de Carlos Drummond de Andrade, traduz bem a dedicação que as mães têm com seus filhos. Tal entrega ainda é mais intensa quando essas mulheres dão à luz crianças especiais. Muitas, ou a maioria delas, largam tudo e abdicam da própria vida para se dedicar somente a essas crianças.
Retrato dessa situação de amor intenso é a vida de Dina Nascimento Gomes, de 37 anos, e Milka Lopes dos Santos, de 40. Ambas têm dois filhos com necessidades especiais e largaram o trabalho de doméstica para cuidar e se dedicar exclusivamente a eles.
Dificuldades como falta de recursos, ausência de tratamentos específicos para as necessidades dos filhos, rejeição e preconceito foram barreiras que elas encontraram pelo caminho.
Alunos da escola Dom Bosco homenagearam mães na última sexta-feira (6)
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Mãe de quatro crianças, Dina Nascimento teve seu primeiro filho especial há nove anos. Marcus Vinícius foi diagnosticado com Lesão do Plexo Braquial – paralisia nos braços que acomete recém-nascidos durante o parto normal e adultos em acidentes de moto e esportes de contato. Brenda, a filha caçula de Dina, nasceu há três anos e também tem o mesmo problema do irmão. A mãe atribui os problemas de saúde dos filhos a negligência médica.
“Durante a gravidez dos dois, os exames e ultrassonografia mostravam que os bebês eram saudáveis. Os partos foram normais, mas as crianças eram muito grandes. O Marcus nasceu com 4,5 quilos e 49 centímetros, e Brenda, com 4,4 quilos e 53 centímetros. O correto seria realizar uma cesárea, porém isso não foi feito. Descobri que o Marcus tinha esse problema um dia depois do parto, quando uma enfermeira pegou no bracinho dele. Percebi que quando ela tirou a mão, o braço caiu igual ao de uma boneca de pano”, relembra a mãe das crianças.
Dina relata que o filho chorava bastante devido às fortes dores que sentia. Ela reclama da falta de assistência médica onde ganhou o neném. “Os médicos não tiveram sequer a gentiliza de avisar que ele nascera com esse distúrbio, descobri por acaso. Depois que procurei saber o que tinha ocasionado essa enfermidade, questionei a equipe por que eles não optaram por uma cesárea, devido ao tamanho do bebê. Disseram que o procedimento me deixaria sem poder fazer movimentos por 24 horas. Mas o que são 24 horas diante de uma vida inteira?”, questiona.
Dina e a filha Brenda
Dina e a filha Brenda
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Quando Marcus Vinícius completou seis anos, Gomes ficou grávida de Brenda. Devido ao parto, a pequena também teve Lesão do Plexo Braquial. Além disso, ela aspirou líquido amniótico durante o procedimento, o que ocasionou uma série de problemas respiratórios. “Apesar de já saber lidar com a situação, foi muito ruim receber a mesma notícia novamente. Para mim, foi como se um buraco na terra tivesse fechado comigo lá dentro.”
Assim como Dina, Milka dos Santos também deu à luz dois filhos especiais. Porém, os problemas que afetam as crianças – Carlos Eduardo, de 11 anos, e Mizael, de 10 – foram ocasionados por fatores genéticos, segundo ela. A ex-doméstica só percebeu que o primeiro filho tinha deficiência 17 dias após o parto, quando notou que o bebê tinha o palato (“céu da boca”) aberto. De acordo com Milka, Carlos Eduardo e Mizael são deficientes físicos e intelectuais.
Ao contrário da maioria das situações, nas quais as mães sabem quais problemas afetam os filhos, Milka ainda não recebeu o diagnóstico final e preciso das enfermidades dos pequenos. “Os médicos diagnosticaram que eles têm uma síndrome, mas não conseguiram identificar qual. O diagnóstico completo e exato ainda não está pronto. Só vou saber que doença é essa daqui a uns meses, quando os exames completos chegarem de Bauru [SP]”, explica Milka.
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Além de Carlos Eduardo e Mizael, Milka também tem uma filha adolescente, de 16 anos. Ela conta que teve que reaprender a cuidar de uma criança depois do nascimento dos filhos especiais, já que os cuidados são totalmente diferentes dos que destinava à primogênita. Quando descobriu que Mizael, o filho caçula, também tinha o mesmo problema que Carlos Eduardo, Milka garante que levou, juntamente com a família, a situação com calma.
“Quando recebi a notícia [de que o Carlos Eduardo era especial] da equipe que estava cuidando dele, a médica me disse que ele não iria sobreviver mais do que três meses. Ela ainda recomendou que eu não me apegasse com a criança, devido à situação. Ouvir aquilo foi bastante difícil para mim. Qual mãe que carrega uma criança durante nove meses no ventre, cuida dela e não consegue se apegar?”, reflete Milka, emocionada ao relembrar.

Dificuldades

O que Dina Nascimento e Milka Santos têm em comum são as barreiras que enfrentam diariamente desde o nascimento dos filhos. Dificuldades financeiras, ausência de tratamentos específicos para as necessidades das crianças, rejeição e preconceito são algumas situações que fazem parte da vida dessas mulheres, como também de suas famílias, desde a vinda dos filhos especiais. Lidar da forma correta com isso é um exercício cotidiano para elas.
A primeira dificuldade de Dina quando Marcus Vinícius veio ao mundo foi a rejeição do próprio marido, pai do menino, pela criança. Depois veio o obstáculo de encontrar tratamento adequado para o garoto e uma unidade de ensino que o acolhesse e ensinasse da forma correta. Por ter largado a vida profissional, a ex-doméstica também enfrentou, logo no início, dificuldades financeiras. A situação chegou a deixá-la sem ter o que comer por vários dias.
“Fiquei muito revoltada com a situação, principalmente por causa da dificuldade de encontrar tratamento do meu filho, e tive depressão. Fiquei uma pessoa muito agressiva e precisei passar nove meses tomando remédios controlados. Nunca pensei em deixar meus filhos desamparados, mas durante um período passou pela minha cabeça a ideia de cometer suicídio. Eu achava que era uma vida difícil e não via outra saída”, diz Dina.
Em relação ao marido, ela afirma que ele agia com indiferença, e não prestou apoio aos dois filhos especiais, enquanto agia normalmente com os outros dois, até os primeiros meses de vida de Brenda. Para a mãe das crianças, esse sempre foi o maior obstáculo a ser superado. “Ele nunca chegou a externar a rejeição que tinha pelos filhos especiais, mas eu notava, pelas atitudes, que ele tinha negação pelas crianças. Aquilo era como uma facada no meu peito. Doía demais presenciar aquela situação de desprezo dentro da minha própria casa”, desabafa.
Apesar de ter o apoio do marido e da filha mais velha para cuidar das crianças, Milka sofreu, e ainda sofre, quando presenciou, ou ainda presencia, os olhares indiferentes das pessoas quando avistam seus filhos. A estranheza repassada em cada expressão, as formas diferenciadas de tratamento – às vezes grosseiras e espantosas – e a rejeição quase unânime das pessoas ao verem as crianças machucam lenta e dolorosamente a mãe.
“Como meus filhos não andam, não falam e se sujam com a própria saliva, devido à síndrome, noto que muitas pessoas evitam chegar perto deles. Quando minha filha mais velha era bebê, a situação era diferente. Por ela não ser especial, todo mundo queria pegá-la no colo e era aceita por todos. Já com o Carlos Eduardo e o Mizael, as pessoas têm rejeição e evitam até manter contato físico. Ninguém quer pegá-los no colo”, revela a mãe, entre lágrimas.

Superação

Força de vontade e amor incondicional moveram e ajudaram essas duas mães a superar as variadas situações adversas. Nenhuma delas desistiu de procurar tratamentos adequados para os pequenos e proporcionar uma vida melhor para eles. Tanto Dina como Milka conseguiram um auxílio financeiro do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), no valor de um salário mínimo, para cada um dos filhos especiais. Outra vitória para elas foi a inclusão deles nas escolas.
Após o nascimento de Brenda, Dina fez com que o marido compreendesse a situação das duas crianças e ensinou-o a amar os pequenos. Agora, indiferença e rejeição são apenas lembranças de um passado distante. O esposo ajuda a ex-doméstica a cuidar dos filhos e conseguir consultas ou outros procedimentos médicos. Mesmo com os preconceitos em relação às crianças, Milka consegue fazer com que Carlos Eduardo e Mizael sejam felizes.
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“Tento relevar as situações que acontecem, mesmo que me causem dor, e ter forças para superar esse tipo de coisa. Hoje eu não trabalho mais e perdi minha independência. Mas estou muito feliz com minha família. Sou realizada e sigo caminhando nessa jornada. Mas a gente que é mãe, principalmente as que têm filhos especiais, sempre deseja o melhor para eles. Posso dizer que sou feliz e estou cumprindo meu dever de mãe”, revela Dina.
Milka dos Santos também tem o mesmo pensamento de Dina: “Hoje eu sou uma mulher feliz. Os médicos diziam que o meu primeiro filho não ia sobreviver, e agora ele já está com 11 anos. Foi uma vitória muito grande conseguir criar meus dois filhos especiais, mesmo aos trancos e barrancos que as dificuldades trazem. Hoje meu maior sonho é que eles andem. Mesmo sendo uma situação difícil, tenho fé e esperança de que eles consigam andar um dia”, diz.
A luta dessas duas mulheres, como as de muitas outras, revela a força e o amor que elas têm para sempre oferecer o melhor aos seus filhos. Histórias como a de Dina e Milka talvez tenham sido inspiração para Mário Quintana ter escrito o poema “Mãe”. Diz ele nos versos: “Mãe… São três letras apenas, as desse nome bendito. Também o céu tem três letras e nelas cabe o infinito… Palavra tão pequenina, bem sabem os lábios meus. Que és do tamanho do CÉU e apenas menor que Deus.
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