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No Dia Mundial de Combate ao Racismo, acreanas relatam a dura realidade entre ameaças e apelidos

O racismo ainda é um grande obstáculo para a população de um país tão plural e diverso como o Brasil

Nesta terça-feira, 21 de março, comemora-se o Dia Mundial de Combate ao Racismo. Com quase 86 milhões de residentes com origens africanas, o Brasil é o segundo país com maior população negra do mundo, ficando atrás apenas da Africa do Sul. De acordo os dados mais recentes do IBGE, os negros (pretos e pardos) eram a maioria da população brasileira em 2014, representando 53,6% da população, no Acre a porcentagem é ainda maior, de acordo com o Estatuto da Igualdade Racial, a população negra – aqueles que se autodeclaram pretos ou pardos- em Rio branco é de 71,53% .
Mesmo assim, o racismo ainda é um grande obstáculo para a população de um país tão plural e diverso como o Brasil. A estudante Adriana Lopes, de 28 anos, explica que desde muito criança começou a perceber a discriminação por causa de sua cor: “Eu não consigo lembrar de uma idade específica, mas muito pequena eu comecei a perceber que pelo fato de eu ser negra tinha que enfrentar brincadeiras, me davam apelidos, diziam que meu cabelo era pixaim”.
A estudante também falou sobre a falta de representatividade na indústria cultural. “Antigamente só se encontrava bonecas loiras de olhos azuis, na TV o padrão de beleza também não é ser negro, e com isso a gente cresce achando que isso é diferente e errado ou principalmente que não é bonito. Alisei meu cabelo por 10 anos pois acreditava que era feio assumir minha identidade, acredito que o racismo, a discriminação racial ou qualquer outra, pode trazer consequências irreparáveis, causa traumas”, explica a estudante.
Racismo é crime inafiançável
Estudante de Nutrição, Isla Fernanda /Foto: Arquivo pessoal
O artigo 5º da Constituição Federal afirma que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (…)”, O inciso XLII estabelece que: “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito a pena de reclusão nos termos da Lei”.
Mesmo que haja uma lei que puna atos racistas, eles existem e estão presentes em todos os ambientes e diferentes esferas. A estudante de nutrição Isla Fernanda, de 18 anos, conta que no Ensino Médio viveu episódios de discriminação racial que marcaram de forma negativa sua vida.
“Quando eu estava no terceiro ano do Ensino Médio foi o caso de racismo mais extremo que eu sofri na vida, eu fui ameaçada por rede social. Duas meninas que eu nem conhecia disseram que iriam atear fogo no meu cabelo e além das ameaças, elas ainda faziam varias chacotas, dizendo que nem precisariam de muito álcool ou gasolina porque o fogo pegaria bem rápido por meu cabelo ser afro”, contou Isla.
As ameaças continuaram e, segundo Isla, foram suficientes para que a estudante precisasse ser transferida de escola: “A partir dai eu não fui mais para a escola por medo, eu tinha medo de que elas cumprissem as ameaças. Elas marcaram até dia que iriam fazer isso. Tentei tomar várias medidas, mas nenhuma deu certo, busquei secretarias e no fim, a secretaria de Estado de Educação achou por bem me mudar de escola, algo que eu considero errado, me senti punida”.
Consequências emocionais
A história do Brasil traz marcas da discriminação racial, e mesmo após mais de 100 anos da abolição da escravatura, essa herança continua acarretando problemas sociais. O racismo velado é forte e vem disfarçado de piadas, de brincadeiras que estão na verdade carregadas de preconceitos e de discriminação que começa cedo, ainda na infância com apelidos e bullyngs diversos.
São essas atitudes que muitas vezes acarretam em consequências severas pelos anos seguintes: “Acredito que as consequências podem ser irreversíveis, representadas desde uma tristeza, depressão ou mesmo suicídio. Os negros sofrem muito e se a pessoa não tiver apoio da família, não for instruída ela dificilmente vai conseguir lidar com aquilo”, explicou Isla Fernanda.
Em uma família onde há muitos negros as dores do racismo parecem ser herança. Adriana Lopes tem uma filha de nove anos e explica que, mesmo tão nova, a filha já teve que passar por situações parecidas com as que enfrentou: “Quando ela tinha cinco anos estava no segundo ano escolar um coleguinha disse a ela que ela era feia e parecia um macaco. A mãe dela era negra e ela também, por isso eramos feias. Conversei com ela e venho trabalhando nela essa questão, hoje ela aceita e entende que somos negras e não precisa ter vergonha disso. Mas no começo, depois desse episódio, eu a vi muito resistente sobre essa autoaceitação, ela dizia que a cor branca era bonita e a preta era feia”, relata a mãe.
Como Denunciar o Racismo
A vítima de racismo deve procurar uma delegacia para registrar um boletim de ocorrência (B.O), em seguida, dar entrada no processo contra discriminação racial. Se a discriminação ocorrer no ambiente de trabalho, a vítima pode procurar o Ministério Público do Trabalho. Se a discriminação não se referir especificamente a uma pessoa, pode-se procurar o Ministério Público do Estado. No Acre existe ainda a Secretaria-Adjunta de Promoção da Igualdade Racial (SEADPIR), que conta com o disque combate ao racismo: 3211-2429.

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