'Tenho pesadelos até hoje', diz ex- professora que desistiu da profissão
Débora Carla teve crise de pânico em sala de aula e toma remédio controlado.
Ex-professora se diz 'frustrada' por não ter conseguido continuar com sonho.
Por nove anos, Débora Carla, de 54 anos, foi professora em uma escola pública de Sena Madureira, município distante 145 km da capital acreana e por mais de um ano deu aulas em um programa de aceleração na escola pública Pimentel Gomes, em Rio Branco. Dos tempos de sala de aula, ela ainda guarda os livros, materiais didáticos que usava e as lembranças ruins que, segundo ela, são as mais marcantes, pois deixaram sequelas físicas e psicológicas.
“Meu sonho sempre foi lecionar, mas fui parar no psiquiatra porque tinha e tenho pesadelos até hoje”, conta Débora, que dava aula para crianças com idades entre nove e 14 anos e tinha que elevá-las da 2ª para a 5ª série do Ensino Fundamental no período de um ano.
Nesse período, a ex-professora diz que, além de sofrer agressões psicológicas e ser vítima de furto dentro da sala de aula, adquiriu tendinite e bursite devido à altura do quadro.
"Vários episódios me assustaram bastante. Vi aluno de 12 anos raspando um giz na carteira e em seguida cheirando. Quando perguntei, ele disse que já tinha cheirado coisa pior. Uma outra aluna de 14 anos sempre chegava maquiada e eu percebia que os meninos mexiam com ela, quando conversei, ela me contou que tinha sido garota de programa. Então, a maioria deles vinha de famílias totalmente desestruturadas, vivenciavam violência diariamente em seus bairros", conta.
No Dia dos Professor, comemorado nesta quinta-feira (15), a ex-professora relata com tristeza o seu último dia em uma sala de aula. Débora ressalta que não culpa os alunos por ter desistido da profissão. Ela diz que metade da culpa é dela, já que não soube "dominar" a turma e os outros 50% foi por conta do sistema social e de educação em que as crianças estavam inseridas.
"Eu estava de costas escrevendo no quadro e a sala estava toda em silêncio. Foi quando um aluno pegou um balão, encheu e apertou. Ele bateu com toda força a bexiga em cima da mesa e aquilo estourou. Parecia uma bomba. Foi a gota d'água e eu não consegui mais de forma alguma ficar naquele lugar. Saí chorando, deixei minhas coisas na sala. Em casa eu só chorava e me tremia", diz.
Não posso e nem quero mais dar aula"
Débora Carla
As histórias dos alunos e a vivência na sala de aula esgotaram a professora que lembra com emoção do sonho que tinha ao se formar em pedagogia. "Sou frustrada porque eu cheguei ao meu extremo. No psiquiatra, fui diagnosticada com síndrome do pânico e transtorno bipolar causado pelo estresse do trabalho. Não posso e nem quero mais dar aula. Preciso de ajuda psiquiátrica até hoje ", lembra.
O G1 procurou a Secretaria de Estado de Educação e Esporte (SEE) para saber sobre as medidas que o Estado vem adotando para diminuir a evasão de alunos e professores. Além disso, questionar sobre os acompanhamentos psicológicos nas esoclas. Em nota, a secretaria informou que implantou recentemente o Comitê de Assessoramento da Gestão.
"Com esse trabalho, os gestores das escolas recebem orientação de projetos e boas práticas. As situações identificadas passam por acompanhamento da gestão. Parcerias com o Conselho Tutelar, Ministério Público, e Secretaria de Estado de Segurança Pública foram firmadas para o fortalecimento das ações de interação com a comunidade para promover a cultura de paz nas escolas", diz.